Políticos a salvo
OS AUTARCAS que foram eleitos em 9 de Outubro anteciparam a tomada de posse para evitar cair sob a alçada da lei de José Sócrates que lhes retira regalias, nomeadamente a contagem a dobrar do tempo de exercício do cargo para efeitos de reforma, um direito até agora reconhecido aos autarcas com pelo menos seis anos em funções. O esquema foi possível porque a lei, aprovada a 15 de Setembro, demorou 19 dias a sair da Assembleia da República, levando a que, depois de promulgada pelo PR, apenas fosse publicada exactamente no dia seguinte ao das eleições autárquicas. Ainda assim, se a lei entrasse imediatamente em vigor, no dia 10, seria impossível aos autarcas anteciparem-se aos seus efeitos. Só que nem o Governo nem a AR se lembraram de determinar que a Lei 25-A/2005 vigorasse no dia da publicação, ao contrário do que aconteceu quando, por várias vezes, se conferiram novos direitos aos políticos. Não tendo aposto qualquer artigo sobre a entrada em vigor, funciona a «vacatio legis» de cinco dias no Continente e 15 nas Regiões Autónomas. Évora e Celorico de Basto estão entre os casos dos que conseguiram tomar posse antes, numa pressa inédita cuja explicação deixa muitas dúvidas.
Mas, pior do que isso, muitos autarcas acreditam que a lei só entrará em vigor a 1 de Novembro. Porque o Estatuto dos Eleitos Locais, republicado em anexo no final da Lei 25-A/2005, conserva o artigo 28.º que determina: «A presente lei entra em vigor no dia 1.º do mês seguinte ao da sua publicação». Por causa deste artigo, uma «febre» de tomadas de posse assolou o país. Em Lisboa, Carmona Rodrigues antecipou a posse uma semana.O Governo, reconhecendo terem sido levantadas «dúvidas», veio entretanto afirmar em nota da Presidência do Conselho de Ministros que a «republicação em anexo» do Estatuto dos Eleitos Locais «não produz qualquer efeito quanto à entrada em vigor da lei» que agora vem restringir direitos dos autarcas.Mas fica por esclarecer por que razão nem o Governo nem a AR revogaram o dito artigo. O constitucionalista Jorge Miranda entende que «mais valia que se eliminasse a antiga norma na republicação, ou então que se tivesse disposto que a nova lei entrava imediatamente em vigor». Embora admita que a interpretação do Governo é a mais correcta, diz que «eventualmente haverá debate jurídico» que poderia ter sido evitado.
Outro constitucionalista ouvido pelo EXPRESSO, Marcelo Rebelo de Sousa, vai mais longe nas dúvidas legais. O professor não acredita que tenha havido «distracção num diploma que demorou tanto tempo a elaborar»,
«NORMALMENTE a republicação de um diploma legal alterado, incorporando as alterações, não implica o tomar-se em consideração disposições originárias sobre a sua entrada em vigor. E, por isso, é frequente que, ao alterá-lo, se revoguem essas disposições.
O estranho neste caso é que a Assembleia da República tenha expressamente revogado o artigo 33.º da Lei n.º 4/85 de 9 de Abril, sobre a sua entrada em vigor, e não tenha revogado o artigo 28.º da Lei 29/87 de 30 de Junho, relativa à entrada em vigor deste diploma. Esta curiosa dualidade de critérios, certamente não devida a distracção num diploma que demorou tanto tempo a elaborar, é a fonte das dúvidas sobre se o tal artigo 28.º serve para alguma coisa, ou seja, se serve para que as alterações à Lei 29/87, sobre o Estatuto dos Eleitos Locais, apenas entrem em vigor em 1 de Novembro próximo».
Também Gomes Canotilho põe em causa a técnica legislativa, embora considere que a data do diploma republicado «não tem efeitos agora».
A marcha no Parlamento do diploma que retirou regalias aos políticos foi longa, depois da sua aprovação (com a abstenção do CDS) a 15 de Setembro: só saiu da AR 19 dias depois.
Falta de cuidado?
Durante oito dias esteve na 1.º comissão, para redacção final. O comunista António Filipe, membro desta comissão diz «que podia não ter demorado tanto tempo», considerando porém «que não foi excessivo». Por seu lado, o presidente da comissão, o socialista Osvaldo Castro, diz que «este processo não podia ter nem menos um dia», esclarecendo que o diploma foi «no dia 28» enviado para o Gabinete de Jaime Gama. O presidente da AR levou até dia 4 para mandar o diploma para Belém.Sobre a controvérsia da data da entrada em vigor, Osvaldo Castro diz: «Eu admiti que podia dar confusão», acrescentando que «o Governo podia ter tido o cuidado de tirar a data de entrada em vigor» no republicado Estatuto dos Eleitos Locais. Osvaldo Castro desvaloriza porém os feitos desta opção.
Manuel Agostinho Magalhães (Expresso)
Mas, pior do que isso, muitos autarcas acreditam que a lei só entrará em vigor a 1 de Novembro. Porque o Estatuto dos Eleitos Locais, republicado em anexo no final da Lei 25-A/2005, conserva o artigo 28.º que determina: «A presente lei entra em vigor no dia 1.º do mês seguinte ao da sua publicação». Por causa deste artigo, uma «febre» de tomadas de posse assolou o país. Em Lisboa, Carmona Rodrigues antecipou a posse uma semana.O Governo, reconhecendo terem sido levantadas «dúvidas», veio entretanto afirmar em nota da Presidência do Conselho de Ministros que a «republicação em anexo» do Estatuto dos Eleitos Locais «não produz qualquer efeito quanto à entrada em vigor da lei» que agora vem restringir direitos dos autarcas.Mas fica por esclarecer por que razão nem o Governo nem a AR revogaram o dito artigo. O constitucionalista Jorge Miranda entende que «mais valia que se eliminasse a antiga norma na republicação, ou então que se tivesse disposto que a nova lei entrava imediatamente em vigor». Embora admita que a interpretação do Governo é a mais correcta, diz que «eventualmente haverá debate jurídico» que poderia ter sido evitado.
Outro constitucionalista ouvido pelo EXPRESSO, Marcelo Rebelo de Sousa, vai mais longe nas dúvidas legais. O professor não acredita que tenha havido «distracção num diploma que demorou tanto tempo a elaborar»,
«NORMALMENTE a republicação de um diploma legal alterado, incorporando as alterações, não implica o tomar-se em consideração disposições originárias sobre a sua entrada em vigor. E, por isso, é frequente que, ao alterá-lo, se revoguem essas disposições.
O estranho neste caso é que a Assembleia da República tenha expressamente revogado o artigo 33.º da Lei n.º 4/85 de 9 de Abril, sobre a sua entrada em vigor, e não tenha revogado o artigo 28.º da Lei 29/87 de 30 de Junho, relativa à entrada em vigor deste diploma. Esta curiosa dualidade de critérios, certamente não devida a distracção num diploma que demorou tanto tempo a elaborar, é a fonte das dúvidas sobre se o tal artigo 28.º serve para alguma coisa, ou seja, se serve para que as alterações à Lei 29/87, sobre o Estatuto dos Eleitos Locais, apenas entrem em vigor em 1 de Novembro próximo».
Também Gomes Canotilho põe em causa a técnica legislativa, embora considere que a data do diploma republicado «não tem efeitos agora».
A marcha no Parlamento do diploma que retirou regalias aos políticos foi longa, depois da sua aprovação (com a abstenção do CDS) a 15 de Setembro: só saiu da AR 19 dias depois.
Falta de cuidado?
Durante oito dias esteve na 1.º comissão, para redacção final. O comunista António Filipe, membro desta comissão diz «que podia não ter demorado tanto tempo», considerando porém «que não foi excessivo». Por seu lado, o presidente da comissão, o socialista Osvaldo Castro, diz que «este processo não podia ter nem menos um dia», esclarecendo que o diploma foi «no dia 28» enviado para o Gabinete de Jaime Gama. O presidente da AR levou até dia 4 para mandar o diploma para Belém.Sobre a controvérsia da data da entrada em vigor, Osvaldo Castro diz: «Eu admiti que podia dar confusão», acrescentando que «o Governo podia ter tido o cuidado de tirar a data de entrada em vigor» no republicado Estatuto dos Eleitos Locais. Osvaldo Castro desvaloriza porém os feitos desta opção.
Manuel Agostinho Magalhães (Expresso)
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home